no mês da mulher

Somos muitas


Março é um mês divisor de águas. No dia 20, por exemplo, iniciou-se o novo ano astrológico. Tal como o outono no Brasil. Além de março também ser caracterizado enquanto o mês da mulher, o que inclui homenagens diversas, programações especiais e debates e rodas de conversa. Contudo, parece que simplesmente ao se falar na palavra "mulher", lugares-comuns ainda se repetem pelas águas de março, o que justifica - e muito - a necessidade de reflexões.

Só falta a música Sexo Frágil, do Erasmo Carlos, para ser a trilha sonora de tamanhos clichês nada despretensiosos. 


"Feliz Dia da Mulher", dizem as velhas e recicladas mensagens de 8 de março, ornadas por rosas, luzes e purpurinas. Pensando bem, isso não parece ser tão incoerente assim. Afinal, em todos os outros dias e noites do ano, as mulheres precisam lidar com medos e inseguranças nada floridos e reluzentes, que só sendo mulher mesmo para viver. E não é "mimimi" ou discurso vitimista, e sim uma realidade cotidiana. 

Na foto ao lado, de Dartanhan Baldez Figueiredo, a performance Pedra no Sapato, de Camila Vermelho, performance Pedra no Sapato 

Mas, para não dizer que não falei nas flores - incluindo os espinhos, as folhas, os caules, os insetos, a interferência da poluição do ar e as pétalas murchas e apodrecidas - gostaria de fazer uma pergunta de caráter cultural e artístico. Você que lê este texto, poderia citar nos comentários o trabalho de uma artista ao qual você teve acesso recentemente? Mas de uma artista que viva em Santa Maria ou região! 

Uma pintura realizada por uma mulher. Uma escultura entalhada por uma mulher. Um filme estrelado, roteirizado, editado ou dirigido por uma mulher. Uma animação feita por uma mulher. Uma fotografia batida por uma mulher. Um espetáculo teatral ou de dança concebido por uma mulher. Uma poesia ou um conto escrito por uma mulher. Uma canção composta ou interpretada por uma mulher. Uma performance experimentada por uma mulher. Uma ação artística idealizada, planejada, produzida e executada por uma mulher. 

Já pensou? Foi simples ou complexo? Pois eu gostaria de compartilhar com vocês alguns de tantos nomes de mulheres que realizam arte e cultura em Santa Maria, com atividades que todos e todas podem ter acesso!

Como as criações da filósofa e pintora Patrícia Felden, com sua série de Cometas Ontológicos e O Olho de Pandora.

A artista visual Maria Valquíria Navarro, cujo exemplar de uma de suas esculturas pertence ao cenário urbano de Santa Maria, no Calçadão Salvador Isaía: o ser que segura(va) um livro, o qual já sofreu diversas interferências públicas.

A produtora editorial e diretora de cinema Natália Beck, que realizou o documentário sobre arte corporal intitulado Metamorfoses (2017).

E a também produtora editorial e editora de vídeo Daiane Bedin, cuja genialidade pode ser conferida nos trabalhos da TV Campus UFSM, tal como em vídeos de espetáculos autorais, como o Alvo de Caça, do grupo de mulheres Amor, Movimento e Dança.

A atriz e artista da dança Joelma Rannov do Carmo, com o espetáculo Mata Hari - A Última Dança, apresentado no Theatro Treze de Maio em outubro de 2018.

A designer Lara Isadora Rodrigues, cujas animações podem ser conferidas em conteúdos jornalísticos e publicitários de Santa Maria.

A fotógrafa Cris Fontoura, cujas fotografias podem ser vistas na exposição Campus de Estrelas, no Shopping Praça Nova.

A atriz e diretora de teatro Karina Maia, que tem muitas realizações reconhecidas, incluindo o espetáculo teatral sob sua direção, A Kantora Kareka, a partir de texto de Eugène Ionesco.

A jornalista e poetisa Melina Guterres, que agita Santa Maria com a Rede Sina e a Sina Poética - inclusive, a próxima edição acontecerá na próxima quarta-feira, dia 27 de março, no Zeppelin Bar.

A empoderada mulher trans Hellen Byanchini, rainha do Carnaval de Santa Maria. A cantora e compositora Jordana Henriques, com a maravilhosa autoria do álbum Aquário.  


E, encerrando a breve lista de nomes de artistas mulheres - tantos outros não foram inseridos aqui, o que não os torna menos importantes - eu não poderia deixar de citar dois.

A produtora e agente cultural Isadora Bispo, da Pondá Assessoria e do Coletivo Ará Dudu, que articula a honorável Muamba, com direito a Pré-Muamba hoje, na Gare de Santa Maria.

E a artista visual Susane Kochhann, curadora da exposição Somos Muitas, da Associação d@s Artistas Plástic@s de Santa Maria - a AAPSM - que estará na sala Monet Plaza Arte, do Monet Plaza Shopping, até o próximo dia 31 de março. 

Foto: Susane Kochhann
Exposição Somos Muitas

A exposição Somos Muitas reúne criações de diversas artistas, na qual tive a oportunidade de performar duas vezes, com Pedra no Sapato, uma performance que busca ir além dos limites os quais somos limitados e limitadas, até os que nós colocamos para nós mesmos e mesmas.  

Enfim, quase ao apagar das luzes de março, é importante que se lembre que mulher não tem um dia. Mulher é o dia. Dias após dia. Mulher é sempre. E nós somos muitas. Somos muitas em Santa Maria. A artista, a dona de casa, a operária, a camponesa, a empresária, a estudante, a indígena, a negra, a trans, a criança, a jovem, a idosa. Que nós mulheres possamos continuar nossos caminhos diários e noturnos, das ações mais simples aos projetos mais complexos.  

Na foto ao lado, a Performance Pedra no Sapato, de Camila Vermelho, com fotografia de Susane Kochhann. 

Que tenhamos o direito de escolha e condições dignas de educação, trabalho, moradia, saúde, sexualidade. Que consigamos viver sem medos, manifestar nossos afetos sem repressões, ter as mesmas possibilidades que qualquer pessoa, independentemente de gênero, deveria ter, numa sociedade mais humana.  

E, quem sabe um dia, as dores e as mágoas sejam apenas águas passadas das muitas de nós que já passaram. 

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